Trânsito

Semana Nacional de Trânsito encerra hoje e fumacense conta sobre acidente

Semana Nacional de Trânsito encerra hoje e fumacense conta sobre acidente

A Semana Nacional de Trânsito teve início no último dia 18 e termina hoje, 25 de setembro. O tema trabalhado pelos órgãos do Sistema Nacional de Trânsito e pela comunidade neste ano foi: “Nós somos o trânsito”. O objetivo desta campanha foi envolver diretamente a sociedade nas ações e propor uma reflexão sobre uma nova forma de encarar a mobilidade. Trata-se de um estímulo a todos os condutores, seja de caminhões, ônibus, vans, automóveis, motocicletas ou bicicletas, e aos pedestres e passageiros, a optarem por um trânsito mais seguro.

Apesar de tantas campanhas, mais de 400 mil pessoas por ano são afetadas por acidentes de trânsito no Brasil, segundo levantamento do Observatório Nacional de Segurança Viária. O estudo revela que, no País, 47 mil pessoas morrem em decorrência desses acidentes.

O levantamento da OMS ainda mostra que as chances de um pedestre morrer sendo atingido por um carro a 50 km/h é de 20%, já com o veículo a 80km/h, as chances de acidente chegam a 60%.

Vale lembrar que além dessa data, o mês de maio, intitulado como Maio Amarelo, também entra nesta luta por um trânsito mais humanizado.

A pergunta que fica é: Com todas essas campanhas de conscientização, por que ainda somos tão irracionais no trânsito? Difícil de responder, o que sabemos é que quando acontece um acidente, os traumas são inúmeros.

No mês de maio deste ano, a atendente comercial Cris Bergmann de Morro da Fumaça, estava voltando da cidade de Criciúma juntamente com a amiga e comadre Andrea da Silva, e a volta foi interrompida de forma brutal. Depois de 11 dias no hospital e várias cirurgias, Cris voltou para casa, voltou só. A amiga de tantos anos, infelizmente não conseguiu sobreviver.

Falar sobre o acidente traz lembranças dolorosas para Cris, no entanto, é uma forma de chamar a atenção de todos para os cuidados que devemos ter ao dirigir e ainda sobre a necessidade de melhores rodovias.

MFN – O que você lembra do acidente?

Cris – Lembro que o carro apareceu como um raio em diagonal, atingindo em cheio a Andréa, era ela que estava na direção. Estávamos iniciando a curva, por isso a surpresa. Lembrava que o carro era preto e grande, pela altura do farol esquerdo que veio em minha direção.

Lembro ainda do exato momento da batida, o som, o vidro quebrando. Apaguei, mas logo acordei porque pude ouvir as pessoas ao redor do carro. Eu não entendia ao certo a posição que estava e sentia muita dor no pescoço, na nuca. Gemia e me pediam calma. Senti quando cortaram meu sinto, próximo ao quadril. Depois soube que não foi a equipe do socorro e sim alguém no intuito de ajudar. Lembro também de ouvir “Cara se começar a pegar fogo eu vou vazar!”. Foi o momento em que senti medo de morrer e torcia para que nos tirassem logo dali. Depois, pelo modo de se comunicarem, percebi que a equipe de socorro havia chegado. Talvez eu tenha apagado antes disso porquê não lembro de ouvir sirenes.

Lembro que a dor aumentava e a tensão também. Me sentia molhada, pensei que estava chovendo, depois concluí que deveria ser sangue. Eles batiam na lataria e pediam calma. Era ensurdecedor pois o carro que estávamos era uma Kangoo, fazia eco na parte de trás que estava vazia. Lembro de sentir eles me pegando na altura da coxa para me retirarem e depois não lembro mais nada. Só quando me entubaram na UTI.

MFN – Houve imprudência da outra motorista? Alta velocidade? Ultrapassagem forçada?

Cris – Foi como um raio que nos atingiu. Foi violentamente rápido e do nada. Era uma curva. A motorista no BO assumiu que perdeu o controle e quando nos viu não deu tempo de nada. Além de bater em nós, que estávamos em nossa pista, de cinto, com airbag que abriu, a Toyota Hilux rodopiou batendo no muro de uma casa a poucos metros.

MFN – Você ficou hospitalizada por quantos dias?

Cris – Eu e Andréa ficamos sete dias na UTI. Passamos por cirurgias. Não sei quantas, nem quais ela fez. Só sei que era doadora de órgãos, mas não conseguiram aproveitar nenhum órgão, tamanho o trauma sofrido. Eu passei por uma Laparotomia Exploradora (abriram meu abdômen completamente) porque o exame acusava hemorragia interna e baço com complicações. Retiraram o baço, suturaram o fígado. Nove costelas do lado esquerdo e três do lado direito. Nas coxas a queimadura do cinto que chegou a perfurar as duas pernas. E minha coluna cervical fraturada – risco de morte ou tetraplegia. Mas para a cirurgia da cervical era necessário aguardar a melhora do quadro. Foi realizada no quinto dia. Sentia muita dor e em certos momentos, tinha que aguardar o próximo horário da morfina, só ela para aliviar a dor. No total foram onze dias no Hospital São José.  Quero agradecer toda a equipe, eles foram maravilhosos.

MFN – Além do trauma psicológico? Ficou algum trauma físico?

Cris – A coluna cervical recebeu prótese e parafusos. Sem o baço minha imunidade fica comprometida e terei que ter cuidado redobrado com a saúde, pois fico mais propensa a infecções. Minhas cicatrizes são elevadas, terei que tratá-las, elas coçam, embolham. Estou também com trombose na perna esquerda devido ao trauma na coxa. Tive infecção na perna esquerda, zipra. Fiquei internada novamente após duas semanas do acidente por sete dias para tratar a infecção e trombose.

Sinto dores musculares e canso com muita facilidade. Ah, desde a UTI precisei de ajuda para respirar. No passado sofri de asma e ela voltou com o acidente. Agora está sob controle porque também fiz fisioterapia respiratória.

Minhas pernas permaneceram terrivelmente inchadas por longos dias. Deitar ou levantar da cama era horrível tamanha a dor que sentia. Levavam minutos para aliviar (de vez enquanto dói quando estou deitada e vou sentar). Entonto quando deito e vou virar para a esquerda, tudo gira.

Tive uma infecção urinária assintomática, de repente urinava sangue. Hospital mais uma vez, mas após alguns exames fui liberada para tratar em casa.

Queda intensa de cabelo, insônia, crises de choro também intensas, foi bastante difícil, mas aos poucos estou me recuperando.

MFN – Como você vê o trânsito na sua cidade e região?

Cris – A sinalização tem que ser melhorada. Já iniciaram os trabalhos, mas há pontos que ainda precisam de atenção do setor responsável. Placas se deteriorando, necessidade de semáforo em alguns pontos críticos.

Na SC 443 a necessidade é ainda maior e urgente. São muitas curvas e há uma sinalização precária. As lombadas eletrônicas ao invés de serem mantidas foram desativadas. Dinheiro público desperdiçado mais uma vez. Já que colocaram por que não realizar a manutenção? Sendo que a necessidade é de mais lombadas eletrônicas e não menos. Olhos de gato deveriam percorrer toda a SC 443! E aumentar a sinalização e avisos de cuidado nas curvas, são muitas! Seria o mínimo do mínimo a ser feito. Trechos com duplicação para ultrapassagem também aumentariam a segurança de quem por ali transita, estamos com medo dessa estrada!

MFN – Na sua opinião qual a causa de tantos acidentes nas estradas? Falta de consciência do motorista? Condições da estrada?

Cris – Há muita imprudência no trânsito sim. O tempo todo vimos ultrapassagens arriscadas, motoristas muito acima da velocidade indicada. Falta educação no trânsito, consciência e responsabilidade. As pessoas não assumem seus erros, tentam fugir de suas responsabilidades o tempo todo. Tentam o famoso “jeitinho brasileiro” e isso tem que acabar. Uso de álcool ou celular ao dirigir é inadmissível. Você está colocando vidas em risco. Arrasando famílias. Eu consegui voltar para a minha família, mas Andréa, assim como tantas outras pessoas não e isso não pode ser esquecido ou tratado como algo comum. Não podemos nos acostumar a isso. Tratar com normalidade o que poderia ser evitado.

MFN – Como foi voltar a dirigir? Deu medo?

Cris – Eu não estava dirigindo, mas mesmo assim o sentimento de culpa e trauma foram muito grandes. Quem sobrevive mas perde alguém tão estimado se pergunta muitas vezes por que ela? Por que não eu? Ela também merecia sobreviver era uma pessoa maravilhosa. A dor é imensa e os pensamentos conflituosos surgem. Eu não me sentia segura em ir pra Criciúma. Doía muito passar por ali. A tensão aumentava quando os carros se aproximavam, principalmente quando surgiam de repente. Dirigir novamente foi estranho. Uma sensação triste, vazia. E eu amo dirigir. Foi quando marquei com uma psicóloga e me disseram que ela trabalhava com um método específico para traumas o EMDR. Ela aplicou comigo, pois eu estava sentido pânico não de dirigir, mas de encontrar as pessoas nas ruas, nos lugares. Recontar era reviver a dor, a memória daquele momento estava gravada em meu corpo e minha mente. E com a aplicação da técnica o trauma foi embora. Fiquei e ainda estou impressionada com essa técnica. Funcionou comigo e pelo que soube com outras pessoas também. Falo isso porque recuperar a segurança em si mesmo e superar o trauma é fundamental para quem pretende voltar a dirigir, voltar a viver sem o medo de ter medo.

MFN – Você acha que o acidente sofrido tinha como ser evitado?

Cris – Não sei o que aconteceu com a motorista e seu carro naquele momento. Algo a fez perder o controle. Estava no celular? Estava com pressa, atrasada? Havia bebido? Falha mecânica?  Não sei o que aconteceu, mas para cada situação há uma solução, uma prevenção.

MFN – Para você que conseguiu sobreviver de um acidente tão grave, qual a sua mensagem para quem está prestes a pegar a direção de um carro?

Dirija com cuidado sempre. Você é responsável por seus atos e vidas podem depender de suas boas ou más escolhas. Você escolhe dirigir embriagado ou sob o uso das mais diversas drogas. Você escolhe mexer no celular enquanto dirige. Você escolhe ultrapassar em lugares inadequados. Você escolhe correr porque está atrasado. São escolhas. Você pode escolher ser prudente. Andréa dirigia há muitos anos. Era uma motorista experiente e responsável. Estávamos de cinto, o carro tinha airbag, estávamos na nossa mão, mas não foi o suficiente. Algo aconteceu no outro carro, mas as vítimas fomos nós. É difícil digerir tudo isso.

Angela Barbara Pereira / Especial
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